O texto de hoje passa-se numa cozinha velha com um fogão assente no chão, uma panela enorme e fumegante, com uma senhora velhinha e curvada a descascar batatas junto dele... Para vocês, se calhar esta imagem não vos diz muito, mas para mim é a imagem que tenho da minha avó de Aveiro a fazer a sua sopa maravilhosa de feijão encarnado.
Esta foi e será para sempre a melhor sopa de feijão que alguma vez comi ou comerei em toda a minha vida. Não havia melhor. Aquecia as almas tristes e como o meu avô dizia dava vida aos mortos. Tinha batatas, cenouras e claro o feijão, mas também tinha esparguete. Não me perguntem porquê, provavelmente por terem passado tanta fome, sempre que podia a minha avó colocava tudo o que encontrava para alimentar os que a rodeavam.
Mas havia uma coisa que esta sopa tinha que mais nenhuma conseguia.... a colher ficava quase de pé cada vez que a colocávamos ao alto. Quase não precisávamos de comer mais nada, mas com a minha avó isso era totalmente impossível. Haviam os seus bifes com as famosas batatas fritas, outras que ela fazia como ninguém, e a galinha com massa.
Não conseguíamos sair daquela casa sem comer qualquer coisa: pão, bolachas, bolos, café, leite, chá.... Não conseguíamos, tentávamos, mas era impossível fugir dela e da sua comida. Da sopa fosse a que horas fosse eu não fugia. Adorava e como percebem ainda hoje me lembro com saudade.
Não gosto de canja, mas a da minha Rosa, a de Aveiro, pois a minha outra avó, que também era Rosa, era a de Lisboa (e já agora, a comida dela também era de sonho, desde a famosa feijoada, à dobrada e ao meu saudoso cozido, isso é que era mãozinha para a cozinha), era a única que conseguia comer. Sabia a canja, mas não era a típica. Não tinha bolhas de azeite a boiar, não era aguada. Tinha consistência, tinha conforto. Levava batata, como sempre, cenouras, cebolas, ovinhos e massinhas. Sabia muito bem e volto a dizer tenho saudades! Muitas saudades. Das sopas, do mimo, dos seus olhos azuis e da sua personalidade.
Felizmente, tive duas avós maravilhosas com jeito para a cozinha e que me deram algumas das bases para ser o que sou hoje em dia. Deve vir delas o gosto pela comida e por alimentar os outros dando-lhes conforto. Como dizia Rosinha de Aveiro, quando o meu pai faleceu, ou seja quando o filho dela faleceu alimentemos os vivos, que os mortos já não podemos ajudar. Grandes mulheres que me rodearam e que ainda hoje me rodeiam, pois nunca me deixaram, quanto mais não seja com os ensinamentos que me deram e com os aromas e sabores que me deixaram.
Às minhas avós do coração um grande e delicioso obrigada.
Já agora deliciem-se!
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Dou-me a conhecer ? Não. Continuo a ser anónima (Hoje chorei) anónima
Adorei. Aqui de longe...chorei....recordei....e deliciei-me.Com muitas saudades, adoro-te avo.
Quem quer seja, anónimo, digo-lhe que ao escrever este post também chorei, recordei e deliciei-me... A todas as avós, mães, tias, primas e irmãs adoro-vos do fundo do coração.... Obrigada
Bem, Aveiro, as idas da Marquesa a Aveiro onde trazia 1 ovo mole para cada amiguinha da escola e uma caixa para a melhor amiga, 1 caixa e eu achava... justo claro, era a melhor amiga, que de tanto ser massacrada por mim, dava-me mais um, às escondidas claro para mais ninguém pedir... obrigada Marquesa, momentos inesquecíveis, e quanto às lições das avós... recordamos sempre com muita saudade, sinal de momentos calorosamente inesquecíveis que temos. Beijos aos anónimos, quem quer que sejam e a ti.
Gostaria só de lhe dizer que descobri há coisa de uns anos, que afinal a melhor amiga nem gostava de ovos moles.... Tanto desperdício.... Não sei quando voltarei, mas quando isso acontecer logo trarei duas, sim duas caixas só para si....